O discurso do presidente Jair Bolsonaro em Chapecó, nesta quarta-feira, teve endereço certo. Foi embalado para alimentar o eleitorado mais fiel do presidente, aquele que permanece em sua base de apoio mesmo quando oscilam para baixo os índices de popularidade. Bolsonaro pode ter afirmado, textualmente, que está “se lixando” para 2022. Mas sua fala e seus gestos revelam o oposto. 

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Estava tudo lá: os remédios milagrosos, a rejeição às medidas restritivas, o vitimismo, o suposto ‘combate à corrupção’ enquanto aparelha o Estado e a falta de recursos, temperados com algumas doses de preconceito – como no momento em que falou de pacientes com HIV como “classe de comportamentos sexuais diferenciados”. Um caldo de bolsonarismo e um discurso que, à primeira vista, soa desconexo. Mas é repleto de referências que falam a um público bem escolhido.

Para um presidente que diz não estar pensando nas eleições, é curioso que Bolsonaro tenha apelado à memória do eleitor questionando como seria “se o presidente fosse o Haddad”. Trouxe à conversa governos de esquerda, quase num ‘ruim comigo, pior com eles’. Teve espaço ainda para cutucar o Centrão, seu novo aliado, ao sugerir que o Ministério da Infraestrutura é “sempre cobiçado, vocês sabem por quem”. Serve para a retórica do governo ‘amarrado’, que não faz mais porque é impedido por forças externas. Nada mais que narrativa.

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Mas a visita também foi marcada por uma guinada de marketing, imposta pela vitrine nacional da pandemia em que o Brasil se colocou, e puxada pelo novo ministro da Saúde, Marcelo Queiroga. Saiu o general à frente da pasta, entrou o médico, figura mais adequada para – finalmente – defender o uso de máscaras repetindo o mantra de que é preciso, também, cuidar da economia. 

Bolsonaro, que já disse duvidar da eficácia das máscaras, usou a sua quase o tempo todo. De máscara também estava a governadora interina Daniela Reinerh – que, a propósito, não usava só uma, mas duas máscaras sobrepostas.

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O paradoxo bolsonarista aponta que o presidente anda se equilibrando na corda-bamba para alimentar seu eleitorado fiel, enquanto corre para descontar a perda de apoio em bases importantes, como o setor econômico. Fará isso ainda esta noite, quando se encontrará com empresários em São Paulo. Na pauta, a vacina, que o presidente ignorou em seu discurso em Chapecó

Hábil em administrar narrativas paralelas, o presidente veio a Santa Catarina para agitar sua base. Em São Paulo, procurará acalmar os mercados. É a nova cara do bolsonarismo, em sua versão 2.0. Coberto pela máscara está o velho discurso, eleitoreiro e belicoso.

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