A Arteris Litoral Sul, concessionária que administra o trecho Norte da BR-101 em Santa Catarina, ajuizou nesta sexta-feira (13) uma ação de reintegração de posse, com pedido de liminar, para determinar à prefeitura de Balneário Camboriú que providencie imediatamente um local adequado para os 250 índios kaingang que estão há três dias acampados na área de domínio da BR-101, no Km 129. Fotos anexadas ao processo mostram o risco a que as famílias indígenas estão expostas – há mais de 70 crianças no acampamento, que está a poucos metros da pista.

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Além da prefeitura, a Funai também é alvo do processo. A ação, assinada pelo advogado Ítalo Augusto Mosimann, afirma que a escolha do espaço foi uma decisão do município, e que não há segurança ou condições mínimas de permanência. “Eles se encontram literalmente às margens do asfalto da rodovia, sujeitos a acidentes de toda ordem, podendo ser vítimas de atropelamentos, colisões, de veículos que utilizam o local como área de escape”, afirma.

O advogado relata que, durante o período em que esteve no local, foi possível ver as crianças correndo “muito próximo da rodovia, praticamente no acostamento”. Segundo a Arteris Litoral Sul, o trecho onde estão os indígenas é de trânsito intenso, que aumenta na temporada de verão, e onde os atropelamentos são frequentes: foram quatro só este ano.

A ação informa, ainda, que o risco é potencializado pela entrada e saída de veículos do acampamento para compra de artesanato indígena. Não há acesso ou área de desaceleração estabelecida, o que já causou acidentes, segundo o relato da concessionária.

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Acampamento
Acampamento (Foto: Arteris Litoral Sul)

Impasse com terreno

As famílias indígenas que estão acampadas em Balneário Camboriú são de todo o Sul do país. A maioria veio de uma aldeia em Iraí, no Rio Grande do Sul. São grupos que vêm todos os anos à cidade para a venda de artesanato.

Nas últimas temporadas, os índios ocuparam um terreno que pertence à Udesc no Bairro Nova Esperança, em Balneário Camboriú. Mas a universidade avisou a prefeitura, em meados deste ano, que cercaria o espaço para uma obra, e que não poderia ceder a área desta vez.

O município se comprometeu a alugar uma área, e ofereceu uma casa paroquial, às margens da rodovia. Ocorre que as famílias chegaram e o espaço ainda não estava pronto. Sem ter para onde ir, os indígenas montaram o acampamento em frente ao local que seria cedido pela prefeitura – junto à pista da BR-101.

MPF acompanha o caso

O procurador da República Marcelo Godoy, de Itajaí, é quem acompanha o caso no Ministério Público Federal. Ele vinha fazendo a intermediação entre os índios e a prefeitura ao longo dos últimos meses, enquanto se discutia a solução para o impasse que envolve o alojamento.

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Esta semana ele teve duas novas reuniões com representantes dos índios, do município – e, desta vez, também da OAB e da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL). Além da questão do espaço para acampar, também veio à tona uma proposta de ordenamento, por parte da prefeitura, para a venda de artesanato.

O município propôs que os índios não usassem mais a Avenida Brasil – o que gerou um novo impasse. As tratativas terminaram sem solução, e com um melindre a mais entre os indígenas e a prefeitura.

Acampamento indígena
Acampamento indígena (Foto: Luiz Carlos Souza)

Constituição garante direito

A permanência dos índios em Balneário Camboriú costuma ser alvo de reclamação dos comerciantes. Muitos não compreendem os direitos e a cultura dos índios, e propõem um ordenamento que não faz sentido na forma como os Kaingang se organizam.

O procurador explica que cabe ao Ministério Público Federal o papel de guardião dos direitos das comunidades tradicionais brasileiras.

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– A Constituição tem um tratamento específico para as comunidades tradicionais, com respeito aos costumes, história e tradições, e incumbiu o Ministério Público de ser o defensor desses direitos coletivos. Tem características que vêm de longa data, eles têm direito a ver reconhecida a integração entre a tradição deles e nossa vida urbana, o que se tem por comum na nossa sociedade.

O procurador diz que a venda do artesanato, para os grupos que vêm a Balneário Camboriú, vai além da subsistência – é uma questão cultural.

– Faz parte do modo de ser, e temos que conciliar. É reconhecido ao município que faça o ordenamento, mas ouvindo as comunidades.