Serviço público é um assunto tratado, no Brasil, à base da demagogia e da falácia. Uma parte da classe política descobriu que atacar o servidor é um excelente negócio. Cria empatia com o eleitor escandalizado com as benesses de alguns cargos, ou com aquele que foi vítima de um serviço mal feito. E, o mais importante: é uma maneira simples de justificar o aparelhamento do Estado.

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A primeira falácia sobre o serviço público brasileiro é de que ele é superinchado. Com 11,4 milhões de servidores, de acordo com o Ipea (dado corrigido por sugestão de um leitor, que alertou para os números atualizados), não estamos sequer na lista dos países com mais pessoas empregadas pelo Estado. As ricas Noruega, Dinamarca e Suécia têm cerca de 30% da população empregada no setor público, segundo dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Os EUA têm 15%.

O que nos destaca são os gastos com o funcionalismo público. Nesse quesito, de acordo com o Instituto Millenium, o Brasil dispende 13,7% do PIB. É muito. Mas uma reportagem de Bruno Lupion para a Deutsche Welle provou que há muita desigualdade aí. Ele mostrou que, no Executivo, 48% dos servidores ganha até R$ 2,5 mil. Esse valor é o teto para 61% dos servidores municipais no Brasil. No Judiciário, o poder que melhor remunera, os supersalários, acima de R$ 30 mil, ficam com 4,2% dos trabalhadores.

Isso mostra que o problema não está na nossa quantidade de servidores, mas na maneira como lidamos com o serviço público. E como distribuímos os pagamentos e benefícios. São escandalosos os auxílios moradia oferecidos a juízes, por exemplo, que não apenas ganham o suficiente. Mas também têm casa própria.

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É justamente essa fatia dos servidores, a mais abastada, que a Reforma Administrativa proposta pelo governo federal, que chegou nesta quinta-feira (3) ao Congresso, não abarca.

Com a justificativa – muito palatável, aliás – de reduzir os gastos públicos e punir os maus servidores, o governo ameaça um dos fundamentos do serviço público em um Estado democrático, que é a independência. Esse é o ponto crítico quando se fala, por exemplo, no fim da estabilidade, que é uma consequência do afrouxamento das regras.

É evidente que um servidor público que não executa suas funções de forma adequada precisa ser punido e desligado. Só que a estabilidade é o que protege os trabalhadores (que são funcionários do Estado, e não do governo), de serem usados politicamente pelo governo de plantão.

Há outra proposta crítica, que é a ampliação do poder do presidente da República para eliminar autarquias e fundações sem autorização do Congresso. Nessa classificação entram órgãos importantes, e que tratam de questões especialmente delicadas, como o Ibama, o ICM-Bio e a Funai. Um prato cheio para algum governante interessado em eliminar o que não converge com seus interesses.

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O fato é que custo e eficiência do funcionalismo são assuntos a serem debatidos no Brasil. Mas há de se ter cuidado com as cascas de banana, que chegam envolvidas na embalagem dourada do discurso fácil.

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