O Brasil está chato e cansativo (e aqui estou sendo generoso). Por todos os cantos, conflitos, desmandos, turbulências, negacionismos e revisionismos toscos. Num passado recente tínhamos o futebol para nos aliviar. Nem isso sobrou.

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O futebol pentacampeão está um lixo tático, técnico, ético. O treinador da Seleção Brasileira carrega uma falácia messiânica, afetada. Nossa imprensa esportiva é, com raras exceções, resultadista e reducionista.

É chegada a hora de arrumar um novo culpado para o caos nos gramados. O eleito é o árbitro de vídeo. Atrapalha o desenrolar do jogo, confunde as torcidas, tira o poder dos juízes, acaba com os papos de bar…

Logo ele, o VAR, criado para (tentar) trazer justiça a um mundo com códigos estranhos. Um mundo em que a desonestidade vale ouro, em que ganhar roubado, com gol de mão, faz a alegria de muita gente.

Nunca gostei de ver o Botafogo beneficiado por um lance irregular. Assim como nunca acho graça de desgraças, como pequenos delitos do cotidiano e atos de corrupção que não cansamos de descobrir.

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O VAR deveria ser visto como a maior revolução do futebol. Mas, parodiando o cantor-compositor paraibano Zé Ramalho, o que acompanhamos é a peleja do olhar eletrônico contra o caráter de nossos jogadores.

Fora das quatro linhas espero o momento em que o VAR será acusado, julgado e condenado pelas mazelas do país. Tragédias da Vale? Chuvas que matam? Oitenta tiros por engano num carro cheio de inocentes? Casos de feminicídio, racismo e homofobia?

É tudo culpa do VAR.

Ah, o brasileiro e o musculoso poder de inverter valores.

Bem usado, o VAR poderia tirar a máscara de muita gente. O militante de esquerda que critica a direita, mas suborna em troca de favores; o militante de direita que defende seus direitos com o "sabe com quem você está falando?"; o jovem que se queixa da sujeira política, mas não recolhe seu lixo das areias da praia; a dona de casa que reclama dos governantes mas fura a fila do supermercado.

Tricampeão em 1970, o mineiro Tostão é colunista do jornal Folha de S.Paulo. Craque da bola e das letrinhas, ele escreveu recentemente: "Profissionais, de todas as áreas, e todos nós precisamos evoluir. Os seres humanos, tolerantes, justos, extremamente inteligentes, independentes nas análises e condutas, pragmáticos e, ao mesmo tempo, sonhadores, com bom senso, parecem caminhar para a extinção. Serão substituídos por robôs, pela inteligência artificial? É uma esperança".

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Precisamos do VAR em nosso cotidiano mais ordinário. Ele foi criado para corrigir falhas do olhar humano, não para vigiar ações dos pobres de espírito. Longa vida ao VAR!

Curtas

Aqui em Santa Catarina teremos neste domingo as semifinais Avaí x Criciúma e Chapecoense x Figueirense (com transmissão da NSC TV). Com a nobre companhia do VAR. Vamos ver como se comportarão os nossos nobres atletas.

Do escritor francês de origem argelina Albert Camus: "Se o homem falhar em conciliar a justiça e a liberdade, então falha em tudo".

De Hannah Arendt, filósofa alemã, autora do clássico "Origens do Totalitarismo", lançado em 1951, pouco depois da Segunda Guerra Mundial: "Nunca antes nosso futuro foi mais imprevisível, nunca dependemos tanto de forças políticas que podem a qualquer instante fugir às regras do bom senso e do interesse próprio".

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É, faz muito sentido.