Humildemente já falei dele aqui neste espaço. É impossível não voltar a fazê-lo depois de ler "Do que É Feita a Maçã" – coletânea de conversas entre a editora Shira Hadad e o escritor israelense Amós Oz. É um livro apaixonante, que se aprecia vagarosamente para que as páginas não acabem.

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Amós era um intelectual de verdade. Morreu no fim do ano passado. Pacifista, defendeu até o fim de seus dias uma solução de dois Estados para Israel e Palestina, um sonho quase impossível.

Numa pequena degustação, seguem três trechos desta obra-prima: 

1 – "Escrever é como dirigir o tempo todo com um pé no acelerador e outro no freio. O pé no acelerador é feito de ingenuidade, de entusiasmo, da alegria da escrita. O pé no freio é feito de autoconsciência e autocrítica."

2 – "Um homem que vem e conhece uma mulher, e uma mulher que é conhecida por um homem e também o conhece. Tanto assim que o ato comum dos dois já não é mais o cruzamento de dois atos, nem mesmo é mais a fusão de dois corpos, e sim um ato de amor."

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3 – "Tem gente que pensa que concessão é palavrão. Principalmente jovens idealistas entusiasmados pensam que concessão é uma espécie de fraude, falta de integridade, oportunismo. Para mim a palavra concessão é sinônimo de vida. E o contrário de concessão é fanatismo e morte."

Aqui Amós fala de aceitação. Abrir mão de crenças e verdades para estranhar, conhecer, respeitar e conviver com opiniões alheias, diferenças, diversidades. Parafraseando o grande poeta Fernando Pessoa, conceder é preciso, viver não é preciso.

Ardilosa, a vida nos carrega por caminhos imprecisos. Vagamos ao sabor do vento. Não há exatidão. E sim incertezas, escuridão, ambiguidades, medos, dúvidas, enganos, acertos, erros.

Mas sem concessão é impossível seguir em frente. Nas relações profissionais e afetivas, seja onde for, seja o que for, a vida é impossível sem o poder da concessão.

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Clarice Lispector, mais uma grande poeta, escreveu: "Aquela relutância em ceder, mas aquela vontade do grande abraço".

A concessão é, verdadeiramente, sinônimo de vida. 

(I)mobilidade

Sempre gostei de dirigir. Até o começo deste século, quando fui viver em Nova York, onde me deparei com um metrô de 423 estações e 1.370 quilômetros. Não é limpo, sequer pontual, está invariavelmente lotado. Mas funciona muito bem. E nunca mais pisei num acelerador ou num freio.

Pesquisa do IBGE revelou que Santa Catarina é o Estado que tem mais carros por domicílio no Brasil. O resultado está nas ruas. Florianópolis, por exemplo, sofre diariamente com o trânsito pesado.

Faltam transportes públicos, vias alternativas, caronas solidárias. Faltam inteligência, engenharia e educação de trânsito. Sobra individualismo de motoristas, motociclistas, ciclistas, pedestres, patinadores e afins. 

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E assim a bela capital catarinense vai ficando cada vez mais estrangulada.

Idiotia F.C.

As autoridades brasileiras disputam um troféu itinerante bastante particular: o da inabilidade com o bom senso.

Esta semana o caneco vai para a casa do prefeito do Rio de Janeiro. Marcelo Crivella sugeriu trocar o nome da Ciclovia Tim Maia para "Ciclovia Vasco da Gama" e justificou: "Está caindo muito".

Ele debochou da torcida do clube carioca, mas esqueceu que ali morreram duas pessoas num acidente em 2016.

Mais um gol do Idiotia F.C.