Logo depois de me formar jornalista, tomei uma bizarra decisão: não era hora de trabalhar, precisava estudar mais. E fui fazer Ciências Sociais. Na nova faculdade conheci a mãe de Marina, minha filha. E encontrei o PJ.

Continua depois da publicidade

Ele era, também, estudante de Jornalismo. Isso nos aproximou rápida e fortemente. Nas aulas de Sociologia conversávamos sobre viagens, músicas, livros, amarguras, alegrias e, claro, muito futebol.

Assim como eu, PJ amava futebol – o que nos uniu ainda mais. Torcedor roxo do Fluminense, ele tinha toda a coleção da revista esportiva “Placar”. Era dono de uma memória espetacular. Adorava contar histórias de atletas fracassados e imitar antigos narradores de rádio e televisão. 

O Maracanã era a nossa segunda casa. Jogo ruim, clássico, Seleção Brasileira… Não importava, lá estávamos os dois. Muitas vezes sequer prestávamos atenção no que se passava no gramado. Usávamos o tempo para falar do mundo de nossos sonhos, o mundo ideal.

Nossas famílias formaram uma só. Já éramos mais do que amigos. Éramos irmãos. Irmãos da vida.

Continua depois da publicidade

O tempo passou. Abandonamos o curso de Ciências Sociais. PJ se formou e se tornou jornalista de primeira linha. Assumi um cargo de chefia. Nepotista, convidei o irmão para a equipe. Ele aceitou. E, posso dizer, como é bom ter um irmão perto da gente.

Já nos campos de pelada formávamos uma zaga medíocre e descortês. Muito mais do que jogar, gritávamos e espancávamos os atacantes adversários. Formávamos a “Dupla ZZ”. Eu era o “Zezinho”. Ele, o “Zangado”.

“Zezinho”, não me perguntem a razão. Mas “Zangado” é perfeito. Quanto mais mal humorado, quanto mais irritadiço, mais engraçado ficava o PJ. Vê-lo esbravejando contra tudo e todos, contra jogadores perebas ou contra uma música que considerava ordinária, era maravilhosamente divertido. Ele era o zangado mais bacana que existia.

PJ se foi há pouco menos de dois anos. Ele estava no avião da Chapecoense. A saudade corta, fere, sangra.

Continua depois da publicidade

Lembrar PJ é uma simples homenagem à memória de todos que se foram naquele fim de novembro de 2016. (Aqui, na NSC, meus companheiros perderam amigos queridos e inesquecíveis.)

Lembrar PJ é carregar, cada vez mais, a certeza de que o amor e a amizade são os bens mais preciosos dessa intensa vida.    

°°°

Do filósofo suíço Alain de Botton: “No coração das boas amizades mora um fator imprescindível: a vulnerabilidade. Amizade é o dividendo da gratidão que flui da percepção de que o outro lhe oferece algo muitíssimo valioso: a chave para sua autoestima é sua dignidade “.

°°°

Em curta viagem a Santiago, emocionou a visita ao Museu da Memória e dos Direitos Humanos. Lá está tudo sobre o 9/11 do Chile, o golpe militar comandado pelo assassino Augusto Pinochet, toda a brutalidade e toda a desumanidade da longa ditadura (1973 a 1990). Visita pungente e imperdível.

Continua depois da publicidade

°°°

Do poeta chileno Pablo Neruda: “Só um louco pode desejar guerras. A guerra destrói a própria lógica da existência humana.”

 

Leia outras crônicas