Um dos principais responsáveis pelo programa de intervenção federal no Rio de Janeiro, o general Sergio Etchegoyen, ministro do Gabinete de Segurança Institucional, avisa que não haverá solução mágica, mas que o Estado não tinha mais condições de enfrentar a crise. Nesta entrevista à coluna, no seu gabinete no quarto andar do Palácio do Planalto, Etchegoyen explicou porque essa medida tão radical é necessária e os riscos para Michel Temer. Gaúcho, de Cruz Alta, ele é hoje o homem de confiança do presidente e conselheiro nos temas de defesa e segurança.
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Por que houve a decisão pela intervenção federal no Rio, uma medida tão drástica?
Quando tu estás trabalhando na Garantia da Lei e da Ordem (operação militar nos Estados, de maneira episódica), tu estás trabalhando em cooperação, e tu não comandas, é por adesão. Agora não dá mais. Agora tu tens que assumir o comando de toda essa estrutura e ter resultado.
Qual foi a gota d’água?
O Carnaval. A absoluta insegurança das pessoas, a impossibilidade de andar na rua. O oba-oba que aconteceu no Carnaval de rouba tudo, leva tudo. O Carnaval demonstrou o seguinte: realmente não dá, eles (o Estado) não vão conseguir.
O que leva vocês a acreditarem que essa intervenção vai fazer com que a Polícia Civil e a Polícia Militar do Rio trabalhem em conjunto com a União para que se tenha um resultado positivo? Há o problema da corrupção…
A Polícia Militar e a Polícia Civil no Rio têm profissionais muito bons. Eles também têm gente comprometida com o papel deles. Eu não sei que interlocução, que espaço eles têm para ocupar. Agora, o general (interventor) terá que tomar decisões duras.
Que decisões são essas? O que vai mudar na rotina do cidadão, na prática?
Um diagnóstico, um planejamento ainda serão feitos. Quando eu digo que as pessoas também têm que ajudar é preciso entender que não estamos dizendo uma palavra mágica, um abre-te sésamo que amanhã de manhã está tudo resolvido no Rio de Janeiro. O próprio governador do Estado achou que era boa a solução. O nível de conversa, de convencimento do Pezão foi quase de adesão imediata.
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E se a intervenção não resolver? Não é grande o risco de desgaste?
Muito. Mas existia um outro desgaste, que é cruzar os braços e deixar que o Rio resolva. E existe essa alternativa, que pode ser que dê certo. Temos certeza que vai dar certo. Tem risco? Tem. O outro risco é deixar a tragédia do tamanho que está, porque eles não têm condições de resolver sem o apoio da União.
Ao mesmo tempo, essa intervenção tem reflexos políticos lá na Câmara, na votação da reforma da Previdência…
Essas eram as opções, uma escolha de Sofia. O presidente, quando começou a falar sobre isso, disse que tinha dois objetivos muito importantes na mão: Previdência e a segurança. Então, ele tentou montar uma solução, um modelo que fosse possível transitar de um para outro.
Isso não pode desencadear pedidos semelhantes de outros Estados em crise?
Claro que pode. Também está nas considerações da decisão tomada. Existe um monte de “ses”. Todos esses “ses” pode te deixar sentado sem fazer nada ou botar a cara na janela para apanhar.
As Forças Armadas são preparadas para fazer a segurança pública?
Não. Mas por que as Forças Armadas estão lá? Porque a polícia não dá conta. No Rio Grande do Norte, por exemplo, há 13 anos não tinha concurso para a Polícia Militar, tem 25% do efetivo da Polícia Civil e aí precisa das Forças Armadas. Por quê? Porque as Forças Armadas querem ir ou por que as prioridades locais nunca foram essas? Essa é a questão. A raiz do problema não é o emprego das Forças Armadas lá, o cerne da questão é a incapacidade das organizações locais resolverem o problema.
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A operação no Rio está marcada até dezembro. Vocês só retiram a operação de lá quando as forças locais estiverem prontas para assumir a segurança?
Quando a situação de normalidade ou a situação voltar a um cenário mais próximo da normalidade. Hoje é dramático.
O senhor é a favor da criação de um Ministério da Segurança Pública?
Eu acho que é bom. Tu passas a centralizar na União, com uma única autoridade, o apoio à segurança pública. A União precisa se reorganizar. Hoje isso é uma tarefa do Ministério da Justiça e Segurança Pública, mas entram também mais dois ministérios: Defesa e o GSI. Tem que ter alguém que centralize a política.
Mais um ministério é solução para a crise?
Não. Essa é uma solução política-administrativa. A solução para a crise da segurança está na educação. Como sociedade, perdemos algumas referências, alguns limites. As cenas de um saque no Rio de Janeiro, aquilo é saque de lata de cerveja, não é saque de famintos. Aquilo é saque de déficit moral, de certeza de impunidade, de deboche. Estamos vivendo em alguns lugares do Brasil um delírio coletivo, uma maluquice geral.
A base da crise é ausência do Estado no sistema prisional, hoje controlado por facções criminosas?
Há um sistema inteiro de segurança pública comprometido por leis lenientes, por interpretações equivocadas, por falta de valorização da polícia, por falta de meios para a polícia trabalhar, por corrupção e por falta de educação. Vivemos o tempo das consequências do que nós, como sociedade, fizemos. Vivemos uma crise aguda que tem a ver muito com costumes, com cultura, com tolerância descabida e com perda de limite. Temos uma sociedade que perdeu a disciplina social.
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A segurança vai ser um tema presente nas eleições deste ano?
Vai ser o tema número um dessa campanha, quem quiser se eleger vai ter que discutir isso.