Depois de passar cinco meses produzindo e alimentando as próprias crises, o presidente Jair Bolsonaro tirou da manga uma cartada pouco original. Sem apoio no Congresso, com o filho investigado por suspeita de lavagem de dinheiro, os estudantes nas ruas e a economia estagnada, ele replica uma carta (sem autoria identificada) nas redes sociais para alegar que está sendo vítima daqueles que preferem a política dos conchavos. Inábil politicamente e sem o controle de seu próprio governo, Bolsonaro terceiriza a responsabilidade e tenta conclamar seus eleitores para, segundo ele, colocar o país “de volta ao trilho do futuro promissor”. Mas isso é algo que só depende dele.
Continua depois da publicidade
A frase que mais se ouve em Brasília é que o governo não tem um comando. O presidente anuncia medidas que são desmentidas no instante seguinte pelos próprios auxiliares. A correção da tabela do Imposto de Renda é um exemplo.
– Estamos no meio de uma batalha da Previdência, não adianta me distrair com a tabela do IR – disse o ministro Paulo Guedes (Economia).
No mais recente episódio, Bolsonaro afirmou a um grupo de líderes de partidos que iria cancelar o corte de recursos para educação. Telefonou do próprio celular para o titular da pasta, Abraham Weintraub. Instantes depois, o ministro Onyx Lorenzoni (Casa Civil) entrava na sala para lembrar que o congelamento foi determinado pela área econômica.
Não há dúvidas de que Bolsonaro começou o seu governo implementando uma nova maneira de se relacionar com o Congresso. Nomeou ministros técnicos ou alinhados com bancadas temáticas e avisou que não faria o jogo da troca de cargos. Partidos do centrão, portanto, reclamam. Algo que poderia ser contornado com uma articulação mais eficiente. Mas nem o PSL, partido do presidente, consegue afinar o discurso.
Continua depois da publicidade
Leia também: Protestos contra cortes na educação reúnem milhares em Santa Catarina
Do ridículo vídeo do golden shower, passando pela demissão do então ministro Gustavo Bebianno à briga de olavistas com militares, o núcleo bolsonarista fez de tudo para alimentar o clima de instabilidade. Mas o mais grave é a quebra de sigilo que atinge o senador Flavio Bolsonaro (PSL-RJ). Quem conhece o grupo do MP do Rio que está cuidando do assunto afirma que a investigação vai até o fim. Da mesma forma, o ministro Sergio Moro (Justiça) é visto como alguém que não mexerá uma palha para interferir no resultado da investigação.