Reportagem e análise dos dados: Cristian Edel Weiss | Visualização de dados: Maiara Santos

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Em Santa Catarina, uma em cada 10 unidades educacionais das redes pública ou privada ainda não tem acesso à água encanada. Em quatro escolas catarinenses nem sequer há água para beber. Pelo menos 44 instituições funcionam de maneira improvisada em galpões ou templos de igrejas. E, apesar da obrigação de lei federal, metade dos educandários não têm ao menos uma biblioteca.

As condições das escolas públicas e privadas de Santa Catarina, que compreendem desde a educação infantil até o ensino de jovens e adultos, foram obtidas por cruzamento de dados do Censo Escolar, coletado anualmente pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anisio Teixeira (Inep).

:: Navegue nos gráficos e clique nas cidades nos mapas abaixo para ver detalhes da realidade catarinense em 2018 ::

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O Censo é um retrato da realidade das escolas brasileiras e é compilado todos os anos, de acordo com informações fornecidas pelas direções dos colégios e pelas secretarias municipais e estaduais de Educação.

Atualmente, Santa Catarina tem em atividade 6.449 escolas, das quais 81,5% são públicas e 18,5% privadas. Entre as públicas, 74,6% são das redes municipais e 24,6% das estaduais. Há ainda outras 39 unidades federais que atendem a educação básica parcialmente, como os institutos IFC e IFSC.

Proporcionalmente, as maiores dificuldades estão nas redes municipais. A maior concentração de escola com falta de serviços, como laboratórios de informática, quadras de esportes, internet, saneamento, acessibilidade e espaços de leitura está na Serra, em trechos do Meio-Oeste e do Sul do Estado.

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Escolas sem água, energia ou esgoto da rede pública

Apesar de o Estado despontar entre os primeiros colocados em estatísticas como o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) e taxas de alfabetização, a mais básica infraestrutura não chega a todas as escolas de Santa Catarina. Quatro unidades (três municipais e uma estadual) declararam simplesmente não ter água.

Cinco educandários não têm acesso à rede pública de energia – outras 29 contam apenas com gerador próprio. Além disso, metade das instituições não tem acesso ao esgoto da rede pública.

Em outro aspecto, laboratórios de informática não são realidade em 55,2% das unidades públicas e privadas. Ao olhar só para as públicas, sobe para 57%. Quase 25 anos depois da implantação da internet comercial no Brasil, ainda há 74 unidades educacionais estaduais e 403 municipais sem acesso à rede, mesmo que em baixa velocidade.

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Secretário de Estado da Educação, Natalino Uggioni afirmou, por meio da assessoria, que existem escolas com até 70 anos de construção que há 15 anos não passavam por reforma. Segundo ele, 425 unidades estão com reformas contratadas ou em processo de contratação. Além disso, a pasta tem em curso projeto para prover banda larga à maioria das escolas estaduais.

“Espero que no máximo em 2 anos seja possível prover a grande maioria de escolas com essa estrutura de laboratório de tecnologia e acesso a banda larga. Tudo está em curso e queremos até o final do ano, quem sabe, que metade das nossas escolas faça uso dessa tecnologia”, afirmou.

Já a presidente da União dos Dirigentes Municipais em Educação, Patrícia Lueders, também secretária em Blumenau, defende que a maioria dos municípios estão cumprindo muito além dos 25% de investimentos em educação exigidos por lei, mas ainda há pendências pontuais, especialmente nas cidades com menos recursos.

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Lei federal obriga todas as escolas públicas e privadas a ter biblioteca

Em maio de 2010, a Presidência da República sancionou a lei federal 12.244, que determina a todas as escolas do país, públicas e privadas, a terem pelo menos uma biblioteca. A norma dá prazo máximo de 10 anos para cumprimento da medida – o que se encerra em 2020. Proporcionalmente, o Estado pouco avançou desde a aprovação da norma até o momento, prestes a vencer o prazo.

Na época, 50% de todas as unidades das redes pública e privada dispunham do espaço, mesma participação registrada em 2018. Já sobre o recorte das públicas (estaduais, municipais e federais), houve redução de 47% para 46%, o que pode ser explicado pelo processo de desativação de escolas com poucos alunos na última década e que funcionavam em prédios antigos, mas que já dispunham do serviço.

Conforme a lei federal, é obrigatório ter, no mínimo, um título literário para cada aluno matriculado para a norma ser considerada cumprida.

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Para a presidente da Undime SC, Patrícia Lueders, o desafio maior também está no fato de contratar bibliotecários para gerir os espaços, também exigido por legislação. O secretário de Estado da Educação, Natalino Uggioni, afirmou que a pasta está fazendo levantamento para identificar as necessidades de cada uma das escolas, entre elas a da ausência de espaços de leitura. “Nossas equipes de gerência e coordenação espalhadas pelo Estado são incentivadas a apontar essas necessidades para poder atendê-las o mais rápido possível”, disse em nota.

Acessibilidade é desafio devido ao alto custo

Conforme a presidente da Undime SC, Patrícia Lueders, o principal entrave para avançar na acessibilidade das escolas está no fato de que a exigência surgiu quando a maioria das escolas já estavam construídas no Brasil, o que obriga a readaptações estruturais, que são muito caras. A determinação foi aprovada pelo decreto federal 5.296, de 2004, e não se restringia a apenas escolas.

– Cada secretário tem que fazer um planejamento para prever dentro do orçamento dele como se dará essa acessibilidade. Do dia para a noite, tenho certeza que nenhum município conseguirá tornar todas as escolas acessíveis. A legislação sobre acessibilidade é muito ampla, não perpassa só por rampa ou corrimão. E esse investimento precisa de orçamento.

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Patrícia exemplifica que o desafio é conciliar esse gasto para reparar escolas antigas com o crescimento da demanda por escolas adaptadas.

Plano Nacional estabelecia metas para o tema

Tanto para a ampliação de bibliotecas e salas de leitura, quanto para a implementação de acessibilidade nas escolas, o Plano Nacional da Educação, aprovado em 2014 pelo Congresso Nacional, estabelece metas com prazos de conclusão até 2024. Na metade da vigência do plano, no entanto, pouco se avançou.

O argumento dos gestores tem se baseado no fato de que se previa orçamento e partilha de recursos (incluindo valores obtidos com a exploração do petróleo da camada pré-sal) que na realidade não se concretizaram com a crise econômica que veio a seguir.

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– Quando o Plano Nacional de Educação foi aprovado, previu um orçamento que não apareceu. Nesta semana estaremos com o ministro para ter essa oportunidade de dialogar, porque não é um problema apenas de Santa Catarina. A orientação da Undime é que dirigentes municipais avancem nas suas metas, o que não pode é desistir de atingir o plano. Não ter orçamento não pode ser justificativa – afirma Patrícia.

Restrições limitam e dificultam aprendizado

Para a Cássia Ferri, professora da pós-graduação em Educação da Universidade Regional de Blumenau (Furb), a existência de escolas sem ligação de água da rede, sem internet e bibliotecas, por exemplo, representa o resultado de falta de vontade política de gestores públicos.

– É uma questão de vontade política. Claro que tem as questões de orçamento, que é limitado para todas as áreas, e fazer a manutenção e organização de toda uma rede de escolas é uma tarefa exigente. Mas para tudo existe uma coisa chamada hierarquização, de estabelecer prioridades. O Estado tem uma espécie de assimetria, foi ranqueado no ano passado como um dos mais eficientes do país, mas se observar coisas básicas, como ligação de água, a gente observa que falta organização e planejamento. Um plano de escolas não pode ser plano de governo, tem que ser de Estado, não pode mudar conforme muda a gestão. São as pessoas que não conseguem se organizar para isso. Não dá para dizer que é só falta de recurso.

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A especialista afirma que mesmo com condições adversas as crianças são capazes de aprender, mas em ritmos e qualidade diferentes.

– É a mesma coisa se me perguntar a diferença de percorrer uma distância de automóvel e de bicicleta. Vão percorrer a distância? Vão. Mas em condições diferentes, é uma questão de eficiência. Claro que pode ter aprendizado em escolas sem biblioteca, mas ela é um instrumental e dá possibilidades que não existem em escolas sem bibliotecas. Não gosto quando se diz: “então, aquelas crianças não aprendem”. Elas aprendem, sim, com certa dificuldade, com certa limitação. Mas é muito diferente ter condições de acelerar o processo, deixar mais interessante. É como uma estrada asfaltada e uma estrada de chão – compara Cássia.

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