O nome dele é Marcel Ramos, mas os olhinhos levemente puxados que fazem referência ao perfil oriental lhe renderam o apelido que levaria para a vida: China. Campeão de quase tudo pelo vôlei de Blumenau há mais de uma década, ele ergueu troféus como o dos Jogos Abertos de Santa Catarina, Campeonato Catarinense e da Superliga B. Até a principal competição do país ele conquistou, mas aí representando Florianópolis e não a cidade que o revelou para a modalidade.
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Mas depois de tantas taças, medalhas e triunfos, chegou a hora do levantador – hoje aos 40 anos – tomar a decisão de deixar as quadras. Sim, o atleta que há 23 primaveras representa as cores blumenauenses não fará parte do elenco que disputará a divisão de acesso à elite do vôlei brasileiro neste ano.
A decisão não foi das mais fáceis, é claro, afinal de contas, tudo que China tem veio, direta ou indiretamente, através do vôlei. A faculdade foi paga com o dinheiro do esporte, tal como a pós-graduação. A defesa da tese de mestrado? Falando sobre vôlei. Qual a matéria que ele leciona no curso de Educação Física da Uniasselvi? Vôlei. Como ele conheceu a sua esposa e mãe do Chininha? Através do vôlei também. Os sonhos que se tornaram realidade no decorrer dos anos também foram uma consequência dos levantamentos que se tornaram cortadas à beira da rede.
– Desde que comecei a jogar, aos nove anos, meu sonho sempre foi ser campeão dos Jasc por Blumenau. Isso era muito forte e a cidade não ganhava há algum tempo. Era algo distante. Incentivado pelo professor Artur Novaes, passei por todas as categorias de base, fui campeão nelas e consegui realizar esse sonho e ser tricampeão dos Jogos Abertos – conta o orgulhoso China ao se referir às conquistas em 1997, 1998 e 1999, que interromperam uma seca de mais de uma década ao vôlei da cidade.
Ícone do vôlei blumenauense
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Engana-se quem pensa que China irá se dedicar agora apenas às piñas coladas e aos mojitos à beira da Praia de Gravatá, em Navegantes, onde passa as férias. O atleta que também é treinador das categorias de base irá dar continuidade ao projeto que envolve jogadores mais jovens para manter a tradição de Blumenau de lapidar promessas. Em 2017, por exemplo, o grupo Sub-13 da cidade foi campeão do Estadual e é isso que o (ex?) levantador quer manter para os anos que virão pela frente:
– Não estarei longe do vôlei, tenho muito a contribuir ainda.
Diretor da Associação Professor Artur Novaes – responsável pela gestão do vôlei masculino em Blumenau –, Luís Fernando Novaes crê que o exemplo de profissionalismo de China é a lição que fica para os mais novos. Com a responsabilidade agora de formar talentos ao esporte do município, o atleta terá novos desafios, com a missão de ser a referência àqueles que querem se dedicar às cortadas, levantamentos e defesas.
– Ele é a síntese do nosso clube e do que queremos com o vôlei. Aqui se formou como profissional, cidadão e líder. É, sem dúvida, o grande ícone do vôlei de Blumenau e se tornou mais do que um atleta – defende Novaes, filho do homem que leva o nome do clube e que foi o principal entusiasta do vôlei blumenauense.
Mudança da família e permanência em Blumenau
Manter-se no esporte foi uma das dificuldades e desafios enfrentados por China durante a adolescência. Isso porque quando ele estava em um dos momentos decisivos da curta carreira, aos 17 anos, teve que lidar com a mudança da família. Na época, precisou decidir se arrumaria as malas e tentaria a sorte junto ao pai e à mãe em outro lugar, ou se arriscaria tudo e permaneceria na terra da Oktoberfest. Ele ficou com a segunda opção.
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– Justamente quando comecei a me dedicar mais ao vôlei foi o momento em que minha família decidiu se mudar. Na época eu optei por ficar por aqui, morei no alojamento da Fundação Municipal de Desportos e percebi que era realmente isso que eu queria. Era adolescente, abdiquei de muitas coisas para treinar e comecei a trilhar aquela que seria minha carreira – relata.
Colegas dentro e fora de quadra, China e o técnico de Blumenau, André Donegá, convivem há 23 anos nas conquistas do esporte. Chegaram a jogar juntos em 1994 e, como jogador e técnico, têm um convívio que se estende desde 1997. Viraram amigos e a confiança gerou o respeito mútuo entre um líder em quadra, e um treinador exigente.
– Ele é um exemplo para atletas, alunos, para os que estão iniciando ou terminando a carreira. Esse respeito que ele tem no mundo do vôlei é justamente pelas suas atitudes e valores. Estamos perdendo um excelente atleta, mas ganhando uma pessoa excepcional na comissão técnica – comemora Donegá.
A diretoria já se mexeu para suprir a ausência de China. O levantador Lucas Salim, que estava no Azzurra Alessano, que disputa da Série B do Campeonato Italiano, terá a responsabilidade de assumir a posição. Ah, a camisa 10 de Marcel Ramos? Será aposentada, tal como seu dono.
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– Com certeza vou sentir muita falta, apesar de essa decisão ter sido tomada em função das minhas obrigações profissionais, a parte física também influenciou – finaliza o (ex!) atleta de Blumenau.