Convencionou-se na sociedade um romantismo em torno da criação de filhos. Ouse falar mal da rotina cansativa, dos planos alterados e da vida virada de ponta cabeça. Como resposta virão olhares desconfiados, rostos assustados. Sabe-se lá como surgiu esta convenção, mas ela motiva uma patrulha em torno da maternidade, principalmente, mas também da paternidade. Lendo a coluna da colega Andreia Sadi, na revista Crescer, neste final de semana, tive ainda mais certeza de que deve ser criado o movimento anti romantismo na maternidade e paternidade.
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Andréia é uma das melhores jornalistas do país, e recentemente teve filhos gêmeos, que agora estão com 10 meses. A coluna fala sobre as pessoas que perguntam como ela consegue dar conta de tanta coisa pra se fazer, incluindo vida pessoal e profissional. Como numa resposta que liberta não só a própria Andréia como também uma legião de mães e pais exaustos pela rotina em torno dos filhos, a jornalista diz em alto e bom som: “NÃO DOU CONTA”. Assim mesmo, em caixa alta.
O texto libertador de Andréia coincide com uma conversa que tenho há algum tempo com amigos que pensam em ter filhos. Nunca deixo de destacar o amor incomparável, a evolução pessoal, o sentimento inexplicável. Assim como não tomaria outra decisão e não ser esta. Mas tenho dito a todos: evitem romantizar. As mulheres, por exemplo, são exigidas pelo olhar social como máquinas. Elas precisam fazer exatamente aquilo que foi pergunta à Andréia: dar conta, o tempo todo e de tudo.
Só que a realidade é bem distante dos filmes e novelas onde a criança nasce chorando e depois só aparece sorrindo com alguns anos de idade. Por isso que não há como dar conta de tudo. Longe de mim que isto seja uma reclamação, até porque no meu caso a decisão foi consciente, madura e sem pressão.
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O fato é que a sociedade pinta um cenário de belezas, e só belezas. Toda mulher e todo homem antes de se decidir pela nova fase deve estar consciente. E isto vale principalmente para os homens, que em muitos casos deixam de fazer o mínimo na criação dos pequenos, quando não somem da relação de forma cruel. Pessoas conscientes de suas obrigações e do tamanho das responsabilidades são mais capazes de dar conta do que lhes cabe.
Defendo um debate constante sobre o assunto em rodas de amigos, nas conversas informais e na sociedade como um todo. Vale lembrar das belezas e dificuldades, como num jogo aberto. Não é nada feio ser anti-romântico, neste caso. A realidade é o que se impõe, pelo bem de todos. Inclusive dos nossos filhos, os principais beneficiários de uma relação consciente.
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